SAUDADES DO MÉXICOSantiago S Ramírez CarvajalUma das mais conhecidas máximas do saudoso Stanislaw Ponte Preta diz
“de onde menos se espera, daí é que não sai nada mesmo”. Antagonicamente, um ditado espanhol afirma:
“De donde menos se piensa, salta la liebre”. Em nosso caso, felizmente não foi o Stanislaw que prevaleceu. Com efeito, o México revelou-se uma agradável surpresa, superando amplamente nossas expectativas. A viagem ao México não estava dentro de nossas prioridades para 2018. Nosso favorito era o circuito Escandinávia/Rússia, que acabou não acontecendo. Optamos assim pelo México, mas sem alimentarmos grandes expectativas. No entanto, surpreendentemente, muitas das coisas que vimos e vivemos ultrapassaram de longe tudo o que esperávamos para essa viagem.A primeira coisa que nos impressionou foi o alto grau de religiosidade do povo mexicano. Tinha razão nosso simpático e bem informado guia, Raul, quando falou que para os mexicanos a Igreja não é Católica, Apostólica e Romana, e sim Católica, Apostólica e Guadalupana. A devoção à Virgem de Guadalupe chega a ser comovente. Embora com capacidade para 10.000 pessoas a nova basílica permanece lotada durante as 10 missas que são celebradas a cada dia. São inúmeras as romarias que alegremente chegam de todas as cidades do país, em desfiles intermináveis, a render homenagens à Imperatriz das Américas. As pessoas vêm carregados de flores, de faixas, de guirlandas, de lindas imagens da Virgem, cantando e rezando, cansados, mas alegres. O enorme complexo que compõe o Santuário de Guadalupe, com duas basílicas e várias outras igrejinhas e capelas, cuja visita leva boa parte do dia, bem como a presença de milhares de pessoas, famílias inteiras por todos os lados, representa muito bem a devoção do povo mexicano à Virgem de Guadalupe.A religiosidade do povo mexicano desde os primórdios da sua história pode ser verificada também na Igreja de Santa Maria Tonantzintla, em Cholula onde fica evidente o esforço espanhol para evangelizar os indígenas, sem separá-los bruscamente de suas crenças antigas. Nessa belíssima Igreja, todas as imagens pintadas ou esculpidas permitem uma interpretação dual, num total sincretismo entre a antiga e a nova religião.Um outro aspecto impressionante na cultura mexicana é o seu carácter alegre e musical. Possuidores de um riquíssimo folclore, os mexicanos usam e abusam dele em seu intento de atrair a atenção dos turistas, a quem recebem muito bem. Fomos testemunhas disso em diferentes ocasiões. No maravilhoso espetáculo de balé nacional e na janta com apresentação de músicas e danças típicas pudemos sentir a alma desse povo. Na praça Garibaldi, na Cidade de México, fomos abordados por diversos grupos de mariachis e nos divertimos dançando ao ar livre ao ritmo de suas músicas. No passeio de barco em Xochimilco e no ônibus urbano em Acapulco fomos o tempo todo acompanhados por música. O mesmo aconteceu no indescritível passeio em catamarã pela baia de Acapulco. Até mesmo nossos guias mexicanos Raul e Juan nos brindaram com trechos de canções conhecidas. Esse caráter alegre do povo mexicano pode ser observado até no culto a seus mortos. A despedida de muitos deles é feita com o acompanhamento de mariachis tocando suas músicas preferidas. E no Dia de Finados, as pessoas que partiram são lembradas com festa, dançando e cantando, tendo expostos em altares seus retratos e comidas preferidas. Isto faz sentido porque, para eles, as pessoas não morrem realmente, mas passam a um outro estágio e, no Dia de Finados, vêm visitar e festejar junto com seus seres queridos. A morte só chega de verdade quando a pessoa é totalmente esquecida. As cidades, além do colorido dos altares aos mortos cobertos de flores, são decoradas com ricas esculturas representando a morte, como as caveiras gigantes enfeitadas, e entes folclóricos relacionados à morte, como é o caso da democrática Catrina, que, em seu devido momento, visita todos os lares independentemente da posição social, e dos Alebrijes, animais alados fantásticos, que são guias espirituais das almas no além. Dentre as muitas lembranças da viagem vem à minha mente o Museu de Antropologia, o palácio de Chapultepec e as ruas de Puebla, com suas lindas e coloridas casas de estilo colonial espanhol que a fizeram merecedora da designação, pela Unesco, de Patrimônio da Humanidade. Merece destaque em Puebla a linda e suntuosa capela do Rosário, situada no interior da Igreja de Santo Domingo, com suas paredes totalmente recobertas por lâminas de ouro. Há quem a considere a Oitava Maravilha do Mundo. Também lembro com carinho a visita a Teotihuacán, com suas formidáveis pirâmides do Sol e da Lua e outras relíquias arquitetônicas da época pré-colombiana, e a simpática vila de Coyoacán onde se encontra a casa museu da Frida Kahlo e aquela onde viveu e morreu León Trotsky que, segundo os mexicanos, teria sido assassinado por seu envolvimento com Frida. Não sei se isso é verdade ou fake-news, mas assim nos contaram.Capítulo especial merece Acapulco. Pode ter sido o encanto do famoso balneário, ou talvez as diversas atividades das quais participamos – hidroginástica na piscina, muita margarita ou muita piña-colada, obtidas livremente no bar, passeio em catamarã ou no ônibus musical – mas o certo é que a união e a integração do grupo, que já era boa, ali se consolidou definitivamente. Como esquecer os clavadistas de La Quebrada, arriscando suas vidas saltando no mar do alto de um penhasco de 35 metros de altura? E a belíssima e significativa Capela da Paz? Situada no topo de uma colina, no alto do Club Residencial Las Brisas, um condomínio de alto luxo, essa capela foi mandada construir pelo casal que foi o primeiro dono do hotel que deu origem ao condomínio, em homenagem aos seus dois filhos homens, falecidos num desastre aéreo. Trata-se de uma construção, ao mesmo tempo de grande simplicidade e beleza, que foi idealizada como um lugar de culto ecumênico, tornando-se, assim, um recanto de paz e oração aberto a todas as religiões. Os restos mortais do casal e seus dois filhos repousam eternamente numa cripta no interior da capela. Junto a ela, uma cruz branca, de 42 metros de altura, imponente e solene, pode ser vista de todos os pontos da baía. Linda escultura de duas mãos enormes erguidas ao céu lembra os dois irmãos mortos. A visita à capela foi um momento de muita emoção para o grupo.Por tudo isso e muito mais, o México mostrou ser um país preparado para o turismo, o qual se transformou em uma de suas principais atividades econômicas. Seu povo manifestou em diversas oportunidades a satisfação em receber-nos e a gratidão pela visita, convidando-nos a voltar quantas vezes quiséssemos, com a certeza de que seríamos bem-recebidos. Entre as melhores lembranças de viagem estão, sem dúvida, as das pessoas que nos acompanharam: as inseparáveis Ana e Helena, esbanjando simpatia e descobrindo muitas afinidades com a Gelça; a nossa querida Beth, com seu comovente depoimento na Capela da Paz manifestando sua alegria e agradecimento à Virgem de Guadalupe pela graça de poder andar sem dores e aproveitar toda a beleza de nossa viagem; o simpático casal Laura e José dando um show de dança na Praça Garibaldi ao som de “Bésame mucho” (Gelça e eu bem que tentamos, mas definitivamente a dança não é a nossa praia); a Geni interpretando lindos poemas e monólogos no ônibus, em uma brilhante demonstração de seus dotes artísticos, ou, ainda, vibrando como adolescente diante da casa da Frida Kahlo; a Shirley, descendo elegantemente os degraus da Pirâmide da Lua, sem se segurar em corrimão algum; a Maria e sua animada dança com o afamado Pancho Tequila no passeio de catamarã em Acapulco; a Cleusa e sua inseparável coca-cola de todas as refeições; e a querida e discreta Lourdes, sempre disposta a participar de tudo. Belas e inesquecíveis recordações !Ah, faltou falar do guacamole, que esperávamos saborear intensamente em nossa viagem, mas que só viemos a experimentar com um divino sabor no Jantar Mexicano que a Beth preparou para nós com todo o carinho, quando retornamos para Caxias do Sul.Foi uma linda e inesquecível viagem, junto com um grupo maravilhoso, conduzido pela gentil, doce e competente Mariana, sempre atenta às nossas necessidades. Por trás dela, a presença segura da Magnificat, dando-nos toda a tranquilidade para usufruirmos cada momento de uma programação cuidadosamente organizada e muito bem realizado.
O México deixará saudades!Para ler mais depoimentos das nossas viagens, clique no link: